quarta-feira, 3 de janeiro de 2018

Pétain Henrique Cardoso

Gustavo Maia Gomes

De todos os nossos ex-presidentes ainda vivos, somente um poderia ser a consciência da Nação. É um papel raramente preenchido, mas importante. O do homem ou mulher cheio de sabedoria, moralmente íntegro, respeitado pelos cidadãos. Alguém que fala pouco, durante quase todo o tempo, mas fala o essencial, quando necessário. E é ouvido.
Quem se candidata? – José Sarney? – Perguntem aos maranhenses. – Fernando Collor? – Contenham a indignação. – Lula? – O condenado pela Justiça? – Dilma? A que estoca vento? – Não. Não. Não. Não. Só uma pergunta não soa ridícula: – Fernando Henrique Cardoso? – Sim, poderia ser Fernando Henrique Cardoso.
Mas, não é. O príncipe dos sociólogos perdeu essa oportunidade muitos anos atrás, quando abandonou o candidato de seu partido à própria sorte, ansioso que estava por entregar o país a um ex-operário que (já se sabia, à época) não tinha escrúpulos morais. Às favas a moral, deve ter pensado Fernando: um (ex) operário na presidência combina tão bem com a minha sociologia! E, assim, o príncipe amou a quem lhe odiava.
Nos quinze anos seguintes, esse enredo se repetiria inúmeras vezes: Lula ataca Fernando (de maneira injusta, caluniosa) e Fernando defende Lula (de maneira submissa, acovardada). Na semana passada mais um capítulo: Fernando declara que não queria ver Lula preso, preferia que ele fosse derrotado nas urnas.
Será isso mesmo o que Fernando aspira? Que o personagem sociológico perfeito seja "derrotado nas urnas"? Ou não seria seu desejo secreto ver o ex-operário de novo na Presidência, para comprovar as teses antigas, terminar a Grande Destruição e nos brindar com o socialismo (ainda que "bolivariano")?
Não sei, nem quero saber. Os desejos íntimos daquele senhor não têm importância. Não para mim. Agora, uma coisa, sim, escandaliza: testemunhar um ex-presidente defender (implicitamente, ao menos) a desobediência à lei, com a implicação de que os "líderes populares" não precisam responder à Justiça, apenas às urnas, é grave. Gravíssimo.
Phillippe Pétain (1856-1951), o marechal francês, era chamado "O Leão de Verdum" pelo seu heroísmo na Primeira Guerra Mundial. Na Segunda, desonrou-se, concordando em ser um títere de Hitler, à frente da chamada República de Vichy. Em agosto de 1945, com a derrrota dos alemães, foi condenado à morte por traição. Teve a pena comutada, mas ninguém jamais pensou em considerá-lo a consciência da Nação.
O posto, porém, não ficou vago. Charles de Gaulle (1890-1970), que se recusou a negociar com Hitler, e se tornou o líder da França Livre foi, sim, durante muitos anos, a consciência da sua pátria. Como seria bom ter alguém assim entre nós.

(Publicado no Facebook em 11/12/2017)

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