quarta-feira, 23 de novembro de 2016

O casamento de Fernando Maia Gomes e Maria Moreira Calheiros



Jornal do Recife, 13/10/1918, pág. 1
“ -- Foi a nota chique e elegante da semana”, escreveu o correspondente em Alagoas do Jornal do Recife, na primeira página da edição de domingo 13 de outubro de 1918. Ele se referia ao casamento do major Fernando Maia Gomes com Maria Moreira Rodrigues Calheiros, relatado numa matéria longa, que, a partir do subtítulo O feliz enlace matrimonial, transcrevo, atualizando a grafia e fazendo adaptações mínimas. (Dispenso as aspas. O que estiver entre colchetes [...] é adição ou comentário meu.) 

Fernando Maia Gomes (1885-c.1970) foi irmão de meu avô Nominando Maia Gomes (1887-1966), assim como de José (1874-1946), Alípio (1878-1916), Eulália (Sinhá), Juvenal, Jovino, Amélia, Amália, Frigdiano e Antonio. Seu casamento com Maria Moreira Calheiros (conhecida como Maroquinha), foi o segundo dele. A primeira mulher de Fernando (Afra Lopes Ferreira de Omena) morreu jovem, de parto. Não deixou descendentes. Afra era irmã de Ester e de Eudócia. 

Eudócia foi a esposa de José Maia Gomes, cujo nome (até ser oficialmente mudado) tinha sido José Gomes de Oliveira Maia. Ester, por sua vez, foi casada, primeiro, com Antonio Maia Gomes e, após enviuvar, com Mário Gomes de Barros, filho de Amália (irmã de Antonio), e de Laurentino Gomes de Barros, primo dos Maia Gomes. A mulher de Juvenal, Francisca, era irmã de Laurentino.
 
Os Calheiros (cuja família tem representantes destacados -- e controversos -- na política, por exemplo, Renan Filho, governador de Alagoas; Renildo, prefeito de Olinda, PE; Renan, presidente do Senado Federal) se entrelaçaram mais de uma vez com os Maia Gomes. Além de  Maria ter desposado Fernando, Manoel Rodrigues Calheiros, seu irmão (de Maria), casou-se com Luíza Maia Gomes, filha de José. Há, com certeza, outros casos.

E assim, primos casando com primas, sobrinhos com tias, foi ficando tudo como dantes, no quartel de Abrantes. Pelo menos, até os índios tomarem o forte.


O feliz enlace matrimonial (Jornal do Recife)


Sábado último, realizou-se, no engenho Pau Amarelo, do município de Santa Luzia do Norte [AL], o feliz enlace matrimonial do distinto moço senhor major Fernando Maia Gomes, proprietário do engenho Campo Verde, no Nicho, com a gentilíssima senhorita Maria Moreira Rodrigues Calheiros, irmã dos estimáveis senhores José Rodrigues Calheiros, Joaquim, Mário e Manoel Rodrigues Calheiros e filha do saudoso coronel Manoel Galdino Calheiros.

Desta cidade [possivelmente, Maceió] para a estação de Lourenço de Albuquerque seguiram numerosas pessoas de destaque social, em trem da Great Western que se destinava a Quebrângulo. Em viagem, um grupo de distintos moços resolveu organizar uma sociedade, a fim de, no engenho Pau Amarelo, serem levadas a efeito atraentes e agradáveis diversões.

Essa sociedade tomou o nome de Liga dos Desmastreados, ficando eleita e empossada a seguinte diretoria: presidente, Luís do Rego; vice-presidente, acadêmico de engenharia Olivério de Souza Campos; secretário, Otaviano Wanderley e orador o nosso confrade da imprensa Agerico Vieira. Foram, ainda, eleitos “fiscais” da Liga os senhores Pedro Wanderley, engenheiro Jaime de Souza, Carlos Martins, acadêmico Alísio Goulart e o simpático tenente J. C. Argollo.

Aclamada a diretoria acima, houve palmas e vivas em profusão. Em seguida, foram improvisados vários folguedos. Reinava muita alegria e satisfação. Chegados todos a Lourenço de Albuquerque, lugar de onde deveriam ser transportados para o engenho Pau Amarelo, houve alguma demora. O trem especial da G.W.B.R. [Great Western of Brazil Railway] apareceu-nos após duas horas e minutos.

Vários membros das distintas famílias dos nubentes solicitavam desculpas da estupenda demora, resultado da má direção que se nota na seção de Alagoas que é dirigida pelo sr. Antonio Justino. E todos se expressavam: “Essa Great Western é assim mesmo”.


Pessoas destacadas


Dentre o grande número de excursionistas, destacavam-se os seguintes: Sra. d. [Dona] Santa Oiticica, Mmes. [mesdames, plural de madame] Dr. Quintella Cavalcanti, João Lauria, Dr. Alfredo Oiticica, Hermínio Xavier de Almeida, Juvenal Maia Gomes, José Gomes de Oliveira Maia [nome de batismo, depois modificado para José Maia Gomes], major Francisco Oiticica, Dr. Nominando Maia Gomes, Mlles. [Mesdemoiselles, plural de mademoiselle] Stella Moreira, Olívia de Barros, Nadir Maia Gomes, Arthemia Moreira, Maria Amália Barros, Luzia Maia Gomes [sic. Seria Luíza Maia Gomes?], Maria Eulália Quintella Cavalcanti, Maria do Carmo Lins, Nita Rocha, Gerusa Gomes, Adelaide Lins, Marieta Rocha, Hermínia Lins e muitas outras graciosas.

No engenho Pau Amarelo, todos foram fidalgamente recebidos pelas Exas. [excelentíssimas] famílias Maia Gomes e Rodrigues Calheiros. Após pequeno repouso, foi servido aos presentes farta mesa de doces finos e licores. Cerca de 14 e meia horas, num altar artisticamente armado e confeccionado na alcova da aprazível vivenda, pelas senhoritas Maria José e Maria de Lourdes Moura, o revmo. [reverendíssimo] padre Aurélio Henrique, vigário da freguesia de Rio Largo, celebrou solene missa, após a qual teve lugar o consórcio do Sr. major Fernando Maia Gomes [o redator não menciona o nome na noiva, neste ponto.]

Serviram de paraninfos: por parte da noiva o Sr. coronel Manoel Gomes dos Santos, representando o Sr. Dr. Quintella Cavalcanti, e a Exa. Sra. d. Laura Duarte Quintella Cavalcanti, esposa deste, e por parte do noivo, o Sr. Dr. Pedro Duarte e Exa. consorte d. Rosita Duarte e Dr. Alfredo Oiticica e sua digna consorte d. Clotilde Oiticica.


Convidados


Após essa cerimônia que se revestiu de toda solenidade, o revmo. padre Aurélio Henrique pronunciou uma tocante preleção. Em seguida, teve lugar o casamento civil. Esses atos foram religiosamente assistidos por todas as pessoas que seguiram desta cidade [Maceió] e por grande número de distintos cavalheiros e Exas. famílias que ali se achavam.

Dentre os convidados, notavam-se os seguintes: Mme [Madame] major Demétrio Moura, Sra. d. Joana Calheiros, Mme. major Manoel Serapião Calheiros, senhoritas Maria José e Maria de Lourdes Moura, Leonídia Calheiros, coronel Guilherme Calheiros, major Pedro Calheiros, José Cândido Coelho, Carlos Diniz, coronel Aristides Agra, Dr. José Rodrigues, acadêmico Manoel Calheiros, Dr. Firmino Peixoto, Dr. Pedro Duarte, jornalista Pedro Xavier, Crispim Rocha, Lauro Lima, Pedro Rocha, major Manoel Serapião Calheiros, Oscar Duarte, Luís Medeiros, Mário Calheiros, e muitos outros que nos escaparam à memória.

Após as cerimônias, realizou-se lauto almoço, regado a finos e generosos vinhos. “Au desert”, falaram várias pessoas, entre as quais o jornalista Pedro Xavier, o jovem Mário Calheiros e o Dr. José Calheiros. Este dissertou brilhantemente sobre o tema “A Separação”. Todo o auditório ficou verdadeiramente comovido.

Por fim, fez o brinde de honra o Dr. Alfredo Oiticica que num vibrante improviso discorreu sobre o tema “O Homem”. Os aplausos eram extraordinários. Havia desusado entusiasmo! ... À tarde, foi levada à pia batismal, no altar onde se realizou o casamento, a graciosa Maria do Carmo, filhinha do sr. major coronel Manoel Serapião Calheiros, proprietário do engenho S. Francisco, e de sua Exa. esposa d. Rosa Calheiros.

A Liga dos Desmastreados deu a nota, realizando após esse ato interessantes folguedos, alcançando grande êxito. Às 18 horas, mais ou menos, as gentis senhorinhas Julieta Oliveira e Maria de Lourdes Moura organizaram atraentes e lindos brinquedos de salão, havendo por essa ocasião distribuição de prendas, sortes, bombons e coisas interessantes e agradáveis.


Confortável vivenda


Respirava-se um ambiente puro. Os nossos espíritos saltitavam de alegria e satisfação. Seguramente, pelas 21 horas, dava entrada na confortável vivenda uma harmoniosa orquestra composta de vários professores, sob a direção do conhecido maestro Odilon Medeiros. Houve confusão! Muitas vivas e tiveram logo início as danças. Todos animados e contentes se divertiam muito.

Às 24 horas, mais ou menos, por ocasião do chá, a Liga dos Desmastreados incorporada levou a efeito uma significativa manifestação de carinho e apreço ao jovem casal. Em seu nome e no da Liga, usou da palavra, por aclamação de todos, o nosso confrade Agerico Vieira, sendo por várias vezes interrompido por estrepitosas salvas de palmas. Sucederam-lhe os Srs. Pedro Wanderley e José Rodrigues Calheiros, os quais foram muito aplaudidos.

As danças continuaram até pela manhã do dia seguinte. Às 7 horas, houve um original batizado, o que talvez fosse o que mais impressionou aos distintos convivas. Antes do banho, porém, Agerico, Argollo, Santinho, Zé Rodrigues e outros trouxeram todos na mais franca e espontânea hilaridade! Avaliem os leitores! Consumiram whisky, old tom, vermouth, arrematando com duas grandes garrafas de quinado! E àquela hora! Não tendo ninguém ainda pregado os olhos! Foi uma troça excelente. Talvez a melhor do ano. Notava-se o riso. Havia espontaneidade de espírito e de coração!

Pelas 11 horas foi servido farto almoço usando da palavra, ainda por aclamação, o nosso confrade Agerico Vieira. Às 13 horas, seguramente, seguiram todos em trem especial da Great Western para a estação do Nicho, onde os nubentes estão com a sua confortável casa de residência. Aí foi servido profuso jantar regado a finas iguarias.

Várias pessoas, à noite, regressaram para esta cidade no trem do Recife, enquanto outras ficaram [se] divertindo, dominados por inspirados “tangos”, “cateretês”, “valsas”, “one steps” executados com perícia ao piano pelas graciosas Mlles. Alaíde Moreira, Maria de Lourdes e Maria José Moura. As Exas. famílias dos contraentes cumularam de gentilezas a todas as pessoas que compareceram a essa encantadora festa nupcial. O “bar” esteve a contento geral, irrepreensível, sem a menor discrepância, graças à operosa direção dos conhecidos profissionais Manoel Pelágio e João Leonídio dos Santos.

Terminando esta notícia, enviamos os nossos parabéns ao distinto par, desejando-lhe toda sorte de felicidade.


[Matéria transcrita do Jornal do Recife (13/10/1918, pág. 1)]

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