segunda-feira, 2 de dezembro de 2013

Tributo a Vicente Moreno

Ladeado pelos vereadores Jayme Asfora (esq) e Vicente André Gomes,
Vicente Moreno Filho recebe o diploma de Cidadão do Recife (29/11/13)

Inspirado em Silvio Pessoa Carvalho Junior, cujo belo texto dedicado ao novo Cidadão do Recife acabo de ler, gostaria de deixar também um breve testemunho sobre Vicente Moreno Filho. (Ele preferia ser chamado de Douglas, um apelido de infância. Sensatamente, viria a dar este nome ao seu primeiro filho.)

Conhecemos-nos desde os últimos anos 1950, ele e eu alunos meninos do Colégio Marista, aquele que virou shopping center. Nem sempre fomos da mesma turma, penso eu, mas nomes como os dos "irmãos" Abel, Luciano, José, Roque, Kerginaldo, Paulão, Longhi, Cirilo, Firmino lhes serão tão familiares quanto o são a mim.

Vicente e eu morávamos em Casa Amarela, circunstância que facilitou a formação de uma estreita amizade entre nós. Freqüentei sua casa e me tornei admirador, sobretudo, de seu pai a quem ainda hoje cito como exemplo de pessoa que tinha pouca instrução e muita sabedoria.

Nessa época - agora estou falando dos anos 1960 - íamos quase todos os sábados às então imperdíveis festa de clube. Internacional, Náutico, Português, América, sobretudo. 

Mais para o fim da década, Vicente estudava Direito e já trabalhava em um escritório de advocacia, eu estudava Economia e era repórter do Jornal do Comércio. Entrávamos nos clubes, ele como "policial" (tinha arranjado uma carteira do que chamávamos araque), eu, como jornalista, e nos divertíamos muito. Sempre bebemos com moderação, muito antes de o Ministério da Saúde assim o recomendar. 

As festas eram uma delícia, mas, nelas, minhas "realizações mulherísticas" ficavam sempre abaixo das expectativas. As de Vicente, creio que também, pois a mulher em que ele, já então, realmente, pensava não o encontraria nos clubes do Recife, mas nas casas de Várzea Alegre e numa escola de Natal.

Nas décadas seguintes, nos vimos pouco. Enquanto Vicente construía no Recife uma brilhante carreira de advogado, ao lado de Nicinha, eu andava pelo mundo (São Paulo, Urbana-Champaign, Cambridge, Brasília) estudando e trabalhando. Nos víamos, sim, com certa raridade, mas, sempre, com a mesma alegria. E, em todas as vezes, nos prometíamos outros encontros para breve.

De modo que somos amigos há quase 60 anos. É com a autoridade conferida pelo tempo que registro, aqui, minhas palavras de profunda admiração por Vicente Moreno Filho. Grande homem, grande amigo, grande marido, grande pai, grande advogado, grande amante e propagandista de sua terra natal Várzea Alegre, grande cidadão honorário do Recife.

Emocionei-me durante a cerimônia da Câmara Municipal, meu caro Douglas. 

Parabéns, amigo.

Gustavo Maia Gomes 
(2 dez 2013)

quinta-feira, 28 de novembro de 2013

Juros também visam captar dinheiro estrangeiro

Artumira Dutra
O Povo, Fortaleza, 28/11/2013







O economista Gustavo Maia Gomes diz que o aumento da taxa de juros favorece os objetivos de trazer dinheiro novo para o Brasil e de aumentar a credibilidade do País, além de controlar a inflação. “Juros maiores aumentam a atração para a vinda de capitais de curto prazo e, portanto, contribuem para trazer mais dinheiro de fora”, diz. Com isso, explica Gomes, a alta dos juros serve para atenuar o déficit nas contas nacionais, além de minimizar os efeitos da valorização do dólar.
Ele explica que o retorno a um regime mais ortodoxo de política monetária (juros altos, em resposta ao aumento da inflação) também faz elevar a credibilidade do País diante do mercado internacional. “Os bancos e administradores de fundos gostam de duas coisas: juros altos e segurança de que não haverá bruscas mudanças de política. A elevação dos juros sinaliza a disposição do Governo de adotar políticas impopulares”.

terça-feira, 26 de novembro de 2013

Nordeste em pauta: a reunião de Fortaleza

Um grupo de estudiosos esteve reunido (dias 21 e 22/11/13) na sede do Banco do Nordeste, em Fortaleza. Discutimos trabalhos ainda em elaboração sobre a economia regional. Antônio Márcio Buainain, da Unicamp, presente ao encontro, teve a gentileza de comentar, em artigo n'O Estado de S. Paulo, minha própria contribuição.

O artigo de Buainain está em 
(Publicado no Facebook, em 26/11/2013)

quarta-feira, 6 de novembro de 2013

"A seca" ou "Nem todas as estatísticas são frias"

Gado morto à beira da BR-232, próximo a Serra Talhada, PE.
(Foto de Daniel Maia Gomes, 13/1/13)
Números não mentem: no Semiárido nordestino, em 2012, foram perdidos 80% da produção de feijão, 66% da produção de milho e 40% da de mandioca. Repito: 80% da produção de feijão, 66% da produção de milho e 40% da de mandioca foram perdidos, no ano passado, nos sertões e agrestes, devido à estiagem prolongada.
Não foi tudo: os rebanhos bovino, caprino e ovino diminuíram 9%, 8% e 6%, nesta ordem. A produção de leite caiu 17%. (Todas as comparações são entre o valor medido em 2012 e a média dos valores da mesma variável nos três anos anteriores.) Mais uma vez, a seca devasta a pequena produção agrícola não irrigada e a pecuária nos sertões e agrestes nordestinos. Devasta, sim, pois ainda não acabou.
Somente agora, com a divulgação pelo IBGE, (em 25/10/13), dos resultados da “Produção Agrícola Municipal” e da “Pesquisa Pecuária Municipal” relativas a 2012, foi possível fazer esses cálculos. Mas, como a estiagem se prolongou por 2013, e ainda não se sabe se não continuará no próximo ano, os números relatados são apenas uma parte dos prejuízos que a seca tem trazido. Praticamente, todas essas perdas – que abalam a vida de uma parcela grande da população sertaneja – são absorvidas pelos próprios agricultores e pecuaristas pobres e por suas famílias. O governo socorre com um caminhão-pipa aqui, uma bolsa estiagem ali, uma bolsa família em todos os lugares. Mas isso é um pequeno alívio, insuficiente, vexaminoso. Enquanto isso, a tragédia segue seu curso, matando o que ainda encontra pela frente.
CASOS CRÍTICOS
Houve, por trás das médias, casos, especialmente, dramáticos. A produção de feijão foi reduzida a zero em 326 municípios que, normalmente, são produtores do grão. Em 422 municípios que, em anos de chuvas, produzem milho, não se colheu sequer uma espiga. O mesmo aconteceu – ou seja, produção nenhuma, nada, zero – em 162 municípios que, normalmente, produzem mandioca.
Mais casos críticos.
Os agricultores de Senador Elói, Rio Grande do Norte, produziram 224 toneladas de feijão, em 2011, e apenas uma tonelada, em 2012. Em Ibiara, Paraíba, as perdas foram ainda maiores: as 283 toneladas de feijão produzidas em 2011 se transformaram em apenas uma, em 2012. Em Mata Grande, Alagoas, a produção de feijão havia sido de 649 t, em 2011; reduziu-se a 4 t, no ano seguinte. Condeúba, Bahia, produziu 1.680 t de feijão, em 2011; não mais do que 7 t, em 2012. Monsenhor Tabosa, Ceará, viu sua produção de 2.792 t, em 2011, se reduzir a 12 t, em 2012.
Na cultura da mandioca, houve muitas situações do mesmo tipo. Belém do São Francisco produziu 360 t, em 2011; uma tonelada, em 2012. Cipó, Bahia: 1.080 t, no ano de boas chuvas (2011); 20 t, no ano de seca. Em Bento Fernandes, Rio Grande do Norte, a produção despencou de 5.880 t para 50 t. Em Ielmo Marinho, também no Rio Grande do Norte, as 6.000 t de 2011 viraram 200 t de 2012.
Quanto ao milho, os agricultores de Pesqueira (PE) haviam produzido 1.500 t, em 2011; produziram apenas uma tonelada, em 2012. Ibicuitinga, Ceará, viu sua produção desaparecer: 2.736 t para 6 t. Os agricultores de Monsenhor Tabosa (CE) viveram a mesma tragédia: o município que produzira 8.831 t de milho, em 2011, colheu meras 21 t, um ano depois.
Na produção de leite, embora esta não tenha sido reduzida a zero em nenhum município, alguns casos individuais merecem registro. Entre muitos outros, os de Gurjão e São Domingos, na Paraíba, e Itaíba, em Pernambuco. Gurjão, pequeno produtor, havia produzido 1.300 litros de leite em 2011. Em 2012, sua produção foi um quarto disso: 265 litros. São Domingos esteve no mesmo caso: 1.375 litros, em 2011; 378 litros, um ano depois. Em Itaíba, município maior produtor do Semiárido (tanto em 2011 quanto, apesar do desastre, também em 2012) a produção caiu de 102.283 litros para 59.625 litros.
VACAS POLÍTICAS
A variação dos rebanhos também foi, em muitos casos, dramática. Em Pacoti, Ceará, havia 3.564 cabeças de boi, em 2011; apenas 836, em 2012; em Betânia, Pernambuco, 10.000 bois e vacas, no ano de 2011, deram lugar a apenas 5.309, em 2012. Em Vertente do Lério, Pernambuco, o rebanho caprino era de 1.500 cabeças, em 2011; passou a 461, no primeiro ano da seca. No mesmo município, havia 1.700 carneiros e ovelhas, em 2011; um ano depois, os pesquisadores do IBGE só encontraram 280. Uma parte desses animais foi vendida a preços vis, ou sacrificada fora de hora. Outra parte, talvez, maior, morreu de fome e sede.
A dizimação dos rebanhos provocou perdas de capital que os pequenos pecuaristas levarão anos para recompor, se é que conseguirão. Aqui, também, faltou governo. O gado morreu em pé, devagar, uma vaca por vez. E não apareceu ninguém que evitasse isso. Impossível, não era. Para usar um jargão que a turma hoje instalada em Brasília tanto gostava de usar contra seus adversários: faltou “vontade política”.
E a seca, repita-se, ainda não acabou.
Semiárido nordestino, 2009-12
Efeitos da seca de 2012 sobre a produção de feijão, mandioca, leite e sobre os efetivos de rebanhos bovino, caprino e ovino
Item
 Unidade de medida
Média 2009-11
2012
Quebra % em relação à média 2009-11
Observações
Feijão
Quantidade produzida em t
591.914
120.567
79,6
326 municípios normalmente produtores tiveram produção zero em 2012
Milho
Quantidade produzida em t
2.234.946
758.459
66,1
422 municípios normalmente produtores tiveram produção zero em 2012
Mandioca
Quantidade produzida em t
3.693.299
2.222.645
39,8
162 municípios normalmente produtores tiveram produção zero em 2012
Efetivo do rebanho bovino
Cabeças
15.080.612
13.725.009
9,0
Rebanho não zerou em nenhum município onde havia algum estoque nos anos anteriores à seca
Efetivo do rebanho caprino
Cabeças
7.197.589
6.648.094
7,6
Rebanho não zerou em nenhum município onde havia algum estoque nos anos anteriores à seca
Efetivo do rebanho ovino
Cabeças
8.618.095
8.119.970
5,8
Rebanho não zerou em nenhum município onde havia algum estoque nos anos anteriores à seca
Leite
Mil litros
15.080.612
13.725.009
17,3
Produção não zerou em nenhum município, mas houve casos de perdas acima de 75%
Fonte: IBGE, Produção Agrícola Municipal e IBGE, Pesquisa Pecuária Municipal

Gustavo Maia Gomes

(6 nov 2013)

sexta-feira, 1 de novembro de 2013

Pensando errado sobre seca e Semiárido

Washington Novaes é jornalista. Até onde sei, dos bons. Mas não é especialista em Nordeste, muito menos, em seca ou semiaridez. De certa forma, portanto, devemos perdoar seus enganos. No artigo "O Semiárido ergue as mãos para o alto" (O Estado de São Paulo, 11 de outubro de 2013, disponível em http://www.estadao.com.br/noticias/impresso,o-semiarido-ergue--as-maos-para-o-alto-,1084491,0.htm), ele apenas repete a sabedoria convencional, ou seja, a burrice vastamente compartilhada. Sob a aparência de proposições quase autoevidentes, o texto esconde muita bobagem. 

Seleciono quatro delas, para comentar.

1. Convivência com a seca. Virou moda dizer que descobrimos a pedra filosofal. Que não se trata de “combater a seca”, mas de conviver com ela. Grande besteira. Convivência com a seca não é nenhuma novidade.
O primeiro açude de grande porte no Nordeste (Cedro, em Quixadá, CE) começou a ser construído no Império e foi inaugurado em 1906. É a mais antiga representação da velha política. Alguém pensava, naquela época, que o açude iria fazer chover no Sertão? Claro que não. A idéia era que a água acumulada evitaria que o sertanejo morresse de sede, quando a chuva faltasse. O que é isso, se não "conviver com a seca"? E o que estamos fazendo hoje, com cisternas e transposições, senão melhorar a "convivência" do sertanejo com a seca?
Ariano Suassuna não tem com que se preocupar: ninguém jamais tentou combater o gelo na Sibéria. E nem extinguir a seca por decreto. Nem mesmo a Inspetoria de Obras Contra as Secas (1909) tinha tal pretensão.
2. Desertificação. O discurso da desertificação do Nordeste é uma espécie de primo pobre daquele outro, do aquecimento global. É pobre, mas não tem inveja do rico. Até tenta imitá-lo, na esperança de abocanhar umas migalhas da dinheirama que financia o primeiro.
Não estou brincando: se a tese do aquecimento global é duvidosa, seus simpatizantes, pelo menos, dizem que fazem pesquisas científicas e que seus alertas se baseiam nos resultados dessas pesquisas. A turma de cá anuncia o fim do mundo baseada em pesquisa nenhuma. É uma fraude. E o pior é que a desertificação (jamais nos níveis que eles dizem) talvez até exista, no Semiárido. 
Nunca iremos saber disso, se nos limitarmos a repetir chavões.
3. Fogão ecológico. Quem pode ser contra um fogão ecológico? Ninguém. Por outro lado, que desgraça alguém acha que o fogão ecológico vai evitar ou resolver? O problema do sertanejo não é como economizar três gravetos dos dez que ele ainda encontra pelos caminhos, quando precisa cozinhar. Seu problema não é se ele precisa de dez ou de sete gravetos. Seu problema é precisar de gravetos.
Se tivesse renda, teria um fogão a gás. Se isso fosse julgado inadequado, um pouquinho mais de pesquisa científica é tudo o que falta para viabilizar a energia eólica ou solar barata, não apenas no sertão. Aí, sim, teríamos os verdadeiros fogões ecológicos que economizariam não trinta, mas cem por cento dos gravetos.
4. Soja nos cerrados. A ideia de que o avanço da soja nos cerrados piora as condições sociais nas áreas em que ocorre soa bem aos ouvidos, mas é falsa, absurda e amplamente desmentida pelos fatos.
Muitos de nós conhecemos as "condições sociais" nos lugares do Sertão onde não há soja (nem fruticultura irrigada, nem pólos de confecções...) Agora visitem qualquer uma das cidades onde haja atividade econômica de alta produtividade, seja ela o cultivo de soja ou qualquer outra. A diferença em condições sociais é chocante, a favor da soja (ou da fruticultura irrigada, ou das confecções...).
Um dado interessante: Barreiras, BA, um dos principais pólos da soja, tem 9,3 beneficiários do Bolsa Família para cada cem habitantes. É muito? Talvez seja, mas, dos 413 municípios baianos, somente nove têm menos beneficiários (em %) do que Barreiras. Pelo menos um destes municípios (Luís Eduardo Magalhães) também é um polo de soja.
Sabe o que isso significa? Há menos pobres lá. O pessoal encontra formas produtivas de ganhar a vida e não precisa do auxílio assistencialista. 
É ruim? 
Pra quem vive de trocar um dinheirinho de nada por uma montanha de votos, é péssimo.
Gustavo Maia Gomes

(1 nov 2013)

quarta-feira, 25 de setembro de 2013

Telefones mudos, operadoras inoperantes


Quando comecei a trabalhar, como jornalista, no final dos anos 1960, precisava muito dos telefones e estes, ou não existiam, ou funcionavam pessimamente. Naquele tempo, possuir uma linha telefônica era só para quem tinha muito dinheiro, ou podia esperar pelos esporádicos "planos de expansão" das empresas estatais que monopolizavam o desserviço.

Com a privatização da telefonia -- obra do governo FHC -- as pessoas passaram a se comunicar com o mundo. Hoje, elas têm um, dois, três aparelhos. Mas, se é verdade que isso jamais teria acontecido sem a privatização, também é certo que à saída do Estado tinha de corresponder a ação fiscalizadora das agências reguladoras. No caso, a Anatel.

Por um tempo, tudo funcionou direito. Havia muito mais telefones, e eles falavam e ouviam. Mas o sonho durou pouco. Em 2003, assumiria o poder o partido que emprega compadres. O Governo, as empresas estatais remanescentes e as agências tipo Anatel foram inundadas de pelegos. Incompetentes, em todos os casos; corruptos, em muitos deles. 

Como seria inevitável, os telefones passaram a funcionar cada vez pior, até atingirem o estágio próximo à surdo-mudez que estamos vivendo hoje. E esta é, apenas, mais uma realização do partido que compra votos dos ricos, com empréstimos de pai para filho; dos deputados, com o mensalão; dos pobres, com o Bolsa Família.

Na Venezuela, o governo obriga as pessoas a saírem de casa com as calças borradas, por falta de papel higiênico. No Brasil, o partido que emprega compadres, compra votos e admira o socialismo bolivariano já destruiu a telefonia. Sua próxima meta é fazer com que as partes baixas de todos nós fiquem tão sujas quanto as dos venezuelanos já devem estar.

Mas a meta do partido nefasto só se cumprirá se ele permanecer no poder, após 2014. Será que nós, brasileiros usuários de telefone e de papel higiênico, permitiremos isso? 

Não com o meu voto, tenham certeza.


Gustavo Maia Gomes
(Publicado no Facebook em 25/9/2013)

Uma luz no fim do esgoto


O discurso de Aécio Neves no encontro do PSDB em Maceió, hoje (sábado) pela manhã foi forte, incisivo, feriu as teclas mais sensíveis. Aécio disse o que a oposição precisava ter dito, e não o fez, nas três eleições anteriores: o PT é um partido nefasto. 

Dele, emanam a toda hora atos de corrução, mas não é isso que o faz singular. O PT é perigosamente único, sim, em glorificar a desonestidade; em transformar dirceus e outros bandidos em heróis; em manipular a composição do Supremo; em transformar mentiras em verdades pela exaustiva repetição; em conspurcar a máquina governamental lotando-a de incompetentes; em escravizar o voto dos pobres ao comprá-lo com a distribuição eterna de migalhas que os impedem de se emancipar pelo trabalho produtivo.

Mais que nefasto, o PT é uma ameaça aos cidadãos de bem deste país, entre os quais me incluo. O maior desafio político já enfrentado por nós todos, desde a redemocratização dos anos oitenta, é a remoção dessa gente do comando político do Brasil.


Gustavo Maia Gomes
(Publicado no Facebook, 21/9/2013)

Hay papel?

O socialismo bolivariano não consegue produzir, sequer, a quantidade de papel higiênico de que a população precisa. A situação é dramática, pois, tendo em vista a profusão de discursos chavistas e pós-chavistas que os venezuelanos são obrigados a ouvir, a quantidade de papel higiênico de que eles necessitam é muito elevada.
Gustavo Maia Gomes 
(Publicado no Facebook, 23/9/2013)

quinta-feira, 12 de setembro de 2013

Conseguirá a Voyager 1 encontrar Deus?

A informação me foi passada por Ivan Pedrosa Maia Gomes: depois de 36 anos viajando pelo espaço, a sonda Voyager 1 deixou para trás o Sistema Solar. E mandou uma gravação do que está ouvindo naquelas paragens nunca dantes navegadas! 

É como diz o redator da notícia: dá um frio na espinha imaginar essas distâncias infinitas, essas solidões garcio-marquianas, e a viagem absurda de um pedaço de metal pelas vastidões do Nada. 

De minha parte, reconheço nossa humana insignificância, mas a contemplação do vazio absoluto também me afasta das respostas simplistas para a incontestável impotência. 

Só um grande imbecil criaria um negócio desse tamanho apenas para justificar a cobrança do dízimo pelo pastor da esquina, ou para garantir o reconhecimento social de dois ou três padrezinhos intolerantes que, como todos nós, residem no mais obscuro dos endereços.

Conseguirá a Voyager 1 encontrar Deus?

(Gustavo Maia Gomes, 12/9/2013)


(Leia a matéria do The Atlantic em 

sábado, 24 de agosto de 2013

Anatomia de uma burrice

Após conhecer e analisar a evolução entre 1998 e 2012 da frota de veículos no Brasil, estados e regiões, fiquei impressionado. Todos nós sentimos que o número de carros nas ruas cresceu enormemente e que a quantidade de motocicletas aumentou ainda mais. Mas poucos sabemos quanto estes “enormemente” e “ainda mais” significaram, em uma escala numérica.
O gráfico abaixo mostra as primeiras informações relevantes. Mais adiante, forneço outras.

Ou seja: entre 1998 e 2012, a frota de automóveis no Brasil cresceu à taxa média anual de 8% (no Nordeste, 9%); a de motocicletas, 13% (20%, no Nordeste); e a de ônibus, 7% (9%, no Nordeste). O número de caminhões também cresceu muito, embora menos do que os dos demais veículos citados.
Mas, deixemos os caminhões de lado. Isso daria outra história, igualmente, interessante. 
E AS CIDADES?
Automóveis, ônibus e motocicletas são veículos, predominantemente, destinados ao uso urbano. Portanto, esse brutal aumento de sua frota se foi concentrando nas cidades. Se a malha viária dessas tivesse, também, crescido oito, treze ou sete por cento ao ano, os carros iriam se distribuindo naturalmente por esse espaço maior e, em se tratando de congestionamentos, tudo teria ficado na mesma.
Contudo, as coisas não se passaram assim. Embora não tenhamos dados facilmente disponíveis sobre o número de quilômetros de ruas, podemos usar o tamanho e o ritmo de crescimento da população urbana para obter, aproximadamente, a mesma informação. E a população urbana no Brasil cresceu, entre 1998 e 2012, a uma velocidade não muito maior do que 1,5% ao ano. Em outras palavras: enquanto o número de automóveis, motos e ônibus aumentava seus 10% a cada ano, o espaço para abrigá-los crescia somente 1,5%. 
Ponha isso em quatorze anos e dá para intuir o estrago que ia sendo feito.
Para tornar as coisas mais claras, inventei um "Índice de Congestionamento Urbano". Defini-o como a quantidade de ônibus + a quantidade de carros dividida por três + a quantidade de motos dividida por doze, tudo isso dividido pela população urbana da área (país, região, estado) no mesmo ano. 
A ideia, naturalmente, foi estimar o espaço ocupado pela frota de veículos, em relação ao espaço total existente para a sua circulação. Daí que eu tenha dividido o número de automóveis por três e o de motocicletas por doze, na hipótese de que três automóveis, ou doze motos, ocupam o espaço nas ruas de um ônibus.
Uma das maneiras de apresentar os resultados que encontrei está no gráfico abaixo:

Explico: em 14 anos, o Índice de Congestionamento Urbano foi multiplicado por 2,74, no Nordeste; 2,27, em Pernambuco; e 2,07, no Brasil. Como a situação inicial já não era boa (ou seja, em 1998, as cidades já estavam congestionadas), dá para perceber como o caos urbano atual foi sendo construído, ano após ano, sem que os sucessivos governos federais, estaduais e municipais fizessem, absolutamente, nada para amenizar o desastre.
Bem ao contrário: no caso do governo federal, sobretudo, nos últimos anos, poderosos estímulos fiscais e creditícios foram mobilizados para aumentar a produção e a compra de automóveis e motos, ao mesmo tempo em que nada sequer remotamente comparável era feito para permitir que as cidades abrigassem essa avalanche de novos veículos.
Aviso ao leitor que não sou contra o automóvel, nem a motocicleta. Sou contra a burrice.

Mas, será que foi, mesmo, somente, "burrice"?
Gustavo Maia Gomes 
(24/8/2013)

sábado, 17 de agosto de 2013

Gabeira lembra Jean Paul Sarte

Escreve Fernando Gabeira (“Onde está tudo aquilo agora?”, p. 30): “O existencialismo francês do pós-guerra [leia-se, principalmente, Jean-Paul Sartre (1905-80)] exercia fascínio não só pelas suas idéias mas também pela atmosfera boêmia que o envolvia”.
Vivi um pouco da moda sartreana, mas nunca me envolvi muito nela. Como boêmio, fui uma nulidade; como leitor, seus livros não me entusiasmavam. Apesar disso, a influência de Sartre entre alguns de meus amigos foi grande, em meados da década de 1960.
Na época, os autores que eu lia compulsivamente eram Bertrand Russell (1872-1970), Franz Kafka (1883-1924) e Erich Fromm (1900-80). Dos três, o último – um psicanalista e sociólogo que tentava combinar criticamente o pensamento de Freud e o de Marx – é o menos conhecido hoje. Nos anos 1960 e 1970, entretanto, seus livros vendiam como água no Sertão.
Em retrospecto, acho que Sartre foi, em larga medida, uma fraude. É o que, aparentemente, também pensa Fernando Gabeira (p. 31), quando se refere ao filósofo francês como “um dos mais eloquentes teóricos da Resistência [à ocupação nazista] sem [jamais] ter se metido nela”.

Gustavo Maia Gomes

“Onde está tudo aquilo agora?”

Fernando Gabeira é uma celebridade. Mas ele é, sobretudo, um homem inteligente. Sei disso pelo seu jornalismo, atuação política e, também, por dois dedos de conversas que já tivemos, no Recife e em Brasília.

Acabo de ler o mais recente de seus livros: “Onde está tudo aquilo agora?”, que tem por subtítulo “Minha vida na política” (São Paulo, Companhia das Letras, 2012). Leitura fácil, instrutiva, supinamente interessante.
“Tudo aquilo”, embora Gabeira não o diga expressamente, são os grandes ideais de transformação do mundo que levaram tantos jovens, nos anos sessenta e setenta do século passado, a se voltarem para a política no seu sentido mais nobre – e radical, que não é aquele limitado ao âmbito de atuação dos partidos oficialmente constituídos.
“Onde está tudo aquilo agora?” passa em revista muitos dos acontecimentos da política brasileira vividos, com maior ou menor intensidade, pelas pessoas de minha geração. Recomendo fortemente sua leitura. Não apenas às pessoas de minha geração.
Gustavo Maia Gomes (17/8/2013)

domingo, 11 de agosto de 2013

Universitários no Sertão: a história verdadeira do cititur que nunca existiu

Gustavo Maia Gomes
Do Recife a Petrolina, seriam dez horas de viagem, em um ônibus pequeno. Embarcados, alguns professores e muitos alunos de Turismo e de Hotelaria. Fariam uma “visita técnica”, parte das atividades curriculares. 
Pelo caminho, os rapazes e moças conferiam o programa:
-– Bodódromo?
-– Sim.
-– Vinícolas?
-– Certamente.
-– Passeio de barco pelo lago de Sobradinho?
-– Positivo.
Tudo o que fora previsto, aconteceu. A visita a Petrolina foi um sucesso.
***
Ao fim de três dias, iniciam a viagem de volta, com parada programada em Triunfo. 
-– Teremos cititur?
-– Sim.
A atividade havia sido prearranjada por uma pessoa que desistira de viajar. Faltava, apenas, confirmar onde iriam encontrar o guia local. E a que horas.
Pelo celular, fala a professora responsável pela excursão:
-– Senhor Abdias?
-– Ele mesmo.
-– Somos o grupo que vai fazer o cititur. Está tudo certo?
-- Tudo certo.
-– Onde encontramos o senhor?
-- Ao meio dia, na entrada do Pólo.
-- Que pólo?
-– O Pólo Petroquímico.
-– Mas, não há pólo petroquímico em Triunfo. O senhor está em Triunfo?
-– Estou, sim.
-– Em Triunfo, Pernambuco?
-– Não, em Triunfo, Rio Grande do Sul.
-– Então, Sr. Abdias, temos de cancelar.
(Triunfo, Rio Grande do Sul, fica a 3.500 km de Triunfo, Pernambuco.)

quinta-feira, 8 de agosto de 2013

A inflação de julho, ou uma fábula em três gráficos

Gustavo Maia Gomes


Muito contente, o ministro Mantega mostrou a figura à sua chefe:

– Saiu o IPCA de julho. A inflação vem caindo mês a mês. Não há risco de ela aumentar, está tudo sob controle.



No dia seguinte, Aloísio Mercadante levou outro desenho.

– O Guido lhe enganou. Veja aqui: a inflação sempre cai no primeiro semestre. Não há novidade nisso.



Tão logo Mercadante deixou o Gabinete, a Presidente chamou o Secretário Geral.

– Um ministro me apresenta um desenho com a inflação caindo. Outro mostra que isso sempre acontece no primeiro semestre. Devo mesmo ficar tranquila, Gilberto?

Para manter o espírito da fábula, o secretário já tinha preparado seu próprio gráfico.

– Nenhum dos dois lhe disse o que tem acontecido a partir de julho, Presidenta?




terça-feira, 6 de agosto de 2013

Gás de xisto, ou a revolução sem Marx

Gustavo Maia Gomes
A notícia (há poucos meses, impensável) de que os Estados Unidos podem vir a se tornar não apenas autossuficientes, mas até exportadores de energia prenuncia uma revolução econômica e política de dimensões extraordinárias.
Se as promessas se concretizassem, o que aconteceria?
Entre outras coisas:
O Oriente Médio perderia a importância que, graças ao petróleo, hoje tem. O prestígio internacional de Maomé nunca mais seria o mesmo e as ameaças à paz mundial teriam de vir de outros lugares.
Os bilionários "xeques árabes" se reduziriam à condição de meros passadores de "cheques em árabe" (provavelmente, sem fundo).
Para reduzir o prejuízo, Dubai venderia como ferro velho os pedaços que pudessem desmontar de suas cafoníssimas, mas faraônicas, construções.
Os homens-bomba com motivações político-religiosas continuariam a explodir a si mesmos, porém ninguém mais tomaria conhecimento disso.
No Brasil, os royalties do Pré-Sal seriam repartidos entre duas ligas de dominó, pois extrair petróleo do mar se tornaria completamente inviável.
Com energia barata e abundante, os Estados Unidos entrariam em uma era de rápido e prolongado crescimento econômico, fazendo a atmosfera do planeta (finalmente) virar fumaça.
Beneficiada pelos baixos preços do petróleo, a China cresceria 25% ao ano e invadiria a África, para assegurar os suprimentos alimentares e de matérias primas.
Em seguida, a potência oriental tentaria colonizar o Brasil, mas enfrentaria a resistência dos Estados Unidos cujo Presidente diria: "isto aqui não lhe pertence".

terça-feira, 23 de julho de 2013

A seca nordestina, segundo o Dr. Pangloss

Pangloss é um dos dois personagens centrais de “Cândido, ou o Otimismo”, devastador conto filosófico escrito por Voltaire (1694-1778). Seguidor de Leibniz, o doutor sustentava que tudo o que nos acontece “é sempre o melhor, no melhor dos mundos possíveis”. Tragédias europeias contemporâneas, como a Guerra dos Sete Anos (1756-63) e o Terremoto de Lisboa (1755), jamais abalariam o otimismo panglossiano.
Mas o que Pangloss tem a ver com a seca nordestina?
Eu achava que nada, até presenciar, na manhã do dia 18 de julho, a cerimônia inaugural do XIX Fórum Banco do Nordeste de Desenvolvimento, em Fortaleza. Trata-se de evento realizado em conjunto com o encontro regional da Associação Nacional dos Centros de Pós-Graduação em Economia (Anpec). O Fórum deste ano teve como tema “Semiárido Brasileiro e o Desenvolvimento Regional”.
Num ambiente festivo, com água em abundância, usaram da palavra o presidente do Banco do Nordeste, Ary Joel Lanzarin; o ministro da Integração Nacional, Fernando Bezerra Coelho; e o deputado federal (PT-PE) Pedro Eugênio Cabral. Cada um deu seu recado, com um foco principal: Lazarin, no banco; Bezerra Coelho, nas ações do governo no Semiárido; Pedro Eugênio, na economia brasileira, em geral.
Foi quando descobri que o Dr. Pangloss tem muito a ver com a seca nordestina.
SECA, QUE SECA?
Todo mundo está dizendo que esta seca é a pior dos últimos quarenta, cinquenta, sessenta anos. Do ponto de vista climatológico, pode ser; sob o aspecto de sofrimento humano, dificilmente. Escasso consolo: ser campeão ou vice num torneio de horrores pouca diferença faz. Voltarei a este ponto. Antes, dei uma passada nos jornais, para trazer notícias da seca. Selecionei umas poucas:
“Por causa das intempéries climáticas, a atividade agrícola [do RN] foi toda atingida, restringindo drasticamente os níveis da produção” (22/3/13). “Prejuízo com seca no Nordeste pode superar R$ 12 bi” (23/5/12). “Em alguns estados, 70% do rebanho foi [sic] dizimado” (6/5/13). “O rebanho de gado do semiárido está morrendo ou sendo vendido” (20/12/12). “Mais de um milhão de cabeças de gado morreram em todo o estado” [Bahia] (6/5/13). “Com a seca, criadores de PE já perderam 960 mil cabeças de gado” (22/4/13).
Esse é o quadro do “Semiárido”. E o que tinham a dizer as autoridades responsáveis pelo “Desenvolvimento Regional”? Afinal, “Semiárido e o Desenvolvimento Regional” era o tema do XIX Fórum Banco do Nordeste de Desenvolvimento.
CÂNDIDO, OU O OTIMISMO
As autoridades tinham a dizer coisas maravilhosas. Dou alguns exemplos. Como as cito de cabeça, as palavras entre aspas podem não corresponder exatamente ao que foi pronunciado. Todos falaram de tudo, dizendo a mesma coisa, de modo que não atribuo um autor específico a cada frase. Mas as citações captam o essencial das mensagens transmitidas. Eis algumas delas, seguidas de meus comentários:
“O Banco do Nordeste está atuando vigorosamente. Nossas operações de empréstimos subiram 63%, neste primeiro semestre de 2013, em comparação com o mesmo período do ano anterior”.
Enquanto isso, metade do rebanho bovino morria. De onde se conclui que se o crédito tivesse crescido ainda mais não teria sobrado um boi em pé no Agreste e Sertão nordestinos. Ocorre que os rebanhos são (eram), em sua maioria, pertencentes a pequenos pecuaristas, que haviam levado décadas para acumular aquela relativa riqueza. Sua perda é uma tragédia, pela qual o BNB é corresponsável. Uma tragédia bovina, em primeiro lugar. Humana, em segundo.
“Não houve saques a cidades, nem hordas de flagelados. A rede de proteção social [leia-se, Bolsa Família] funcionou”.
Sem dúvida, este é um fato positivo. Mas, no passado, nos envergonhávamos por recorrer às “Frentes Temporárias de Trabalho” para obter o mesmo resultado. Os governos eram criticados (pelo PT, inclusive) por só terem respostas emergenciais e assistencialistas para as estiagens. Havia, inclusive, recorrentes denúncias de que as Frentes Temporárias de Trabalho alimentavam a “indústria da seca”. Agora, o mesmo PT se orgulha do Bolsa Família. Mas, o que é o Bolsa Família, se não uma nova Frente, não temporária, nem de trabalho? Uma frente que alimenta não a indústria da seca, mas a indústria do voto. Nesse sentido, se antes a corrupção se instalava a cada três anos, agora acontece em sessão contínua.
“O Ministério da Integração está implementando no Semiárido o Programa 1, o Programa 2, o Programa 3, o Programa 4, o Programa 5...”
Outros programas, do estoque inexaurível, só não foram relacionados porque o ministro teve de deixar o recinto para receber a Presidente da República que, em visita ao Ceará, naquele dia, anunciaria mais dois ou três novos programas. À abundância das ações governamentais se contrapõe a penúria agravada pela seca dos que habitam o Semiárido, num enredo sempre igual que parece não ter fim. O ministro faz bem em anunciar tantos bem-feitos, mas a verdade é que seus programas se encontram nos jornais. Fora daí, ninguém sabe onde eles estão.
“Estamos preparando a segunda fase da Política Nacional de Desenvolvimento Regional (PNDR) e já ouvimos todos os estados e muitos municípios”.
A II PNDR é considerada tão importante (pelo Governo) que foi objeto de outra conferência comemorativa, na mesma manhã. Tomara que ela seja importante, mesmo. Porém, uma expectativa mais racional apontaria para outra direção. Pois, se a I PNDR foi a mistura do vácuo com a falta de ar, a II PNDR tende a ser a junção do nada com o inexistente. Menos no discurso oficial, claro. Sintomaticamente, a principal linha de defesa da II PNDR baseou-se no número de pessoas ouvidas durante sua elaboração. Antes de sermos avisados, tínhamos a impressão de que defender uma política com base no número de pessoas ouvidas ficava bem em relatório de ouvidor, não em pronunciamento de ministro responsável por evitar que o gado dos pequenos pecuaristas fosse dizimado pela avalanche de empréstimos do BNB.
O PARAÍSO AQUI E AGORA
As duas citações a seguir – que refletem o pronunciamento do deputado Pedro Eugênio –, não se referem ao Semiárido, mas compartilham do clima triunfalista, autocongratulatório, bem próprio a um evento realizado em Fortaleza, em meio a uma seca que, sem ter, ainda, terminado, já dizimou 50% ou 60% do rebanho bovino regional, além de toda a produção agrícola não irrigada.
“Claro que o Brasil não começou com Lula, como às vezes se diz... [Mas foi quase assim]”.
Ninguém de bom senso diria que o Brasil começou com Lula, como até mesmo o deputado Pedro Eugênio finge concordar. Mas algumas pessoas de bom senso estão começando a temer que o Brasil termine com Lula e com o exército de bajuladores que ele colocou em todos os postos de direção deste país.
“A economia brasileira não tem nada a ver com a européia. Estamos prontos para continuar desfrutando a era de prosperidade [criada pelos governos do PT]”.
Foi muito reconfortante saber que estamos entrando no Paraíso. Pois, até ouvir os esclarecimentos do deputado, 190 milhões de brasileiros, menos um, pensavam que estivéssemos entrando no terceiro ano seguido de estagnação econômica, com uma forte probabilidade de a inflação reiniciar sua viagem à estratosfera. Também pensávamos que a culpa por este descalabro fosse do mesmo governo que o deputado tanto elogia. Felizmente, estávamos todos errados.
EPÍLOGO
Quero informar ao leitor que tudo o que está escrito aqui foi dito em público pelo autor deste artigo, na sua palestra pronunciada à tarde do mesmo dia 18/7/13, no XIX Fórum Banco do Nordeste de Desenvolvimento. (Minha participação no próximo Fórum não está confirmada.) Infelizmente, quando isso ocorreu, o ministro e o deputado já tinham se ausentado do recinto, com vistas a serem fotografados junto à Presidente da República, anunciando novos programas salvadores da humanidade. Mas o presidente do Banco do Nordeste estava presente, fato que foi registrado por duas vezes em meu pronunciamento.
Minha mensagem àquele público foi a mesma que tentei passar neste texto: não importa se a presente seca é a pior ou a “menos pior” dos últimos sessenta anos. Em qualquer hipótese, ela tem sido um escândalo. Utilizá-la como pretexto para auto-elogios governamentais a transforma em um escárnio. 

Gustavo Maia Gomes