segunda-feira, 26 de setembro de 2011

Os trinta maiores nordestinos, segundo o Google


Deixando de lado, por um momento, a conjuntura, e olhando para coisas mais permanentes, quem foram os trinta maiores nordestinos da História?

Lanço abaixo uma lista preliminar. Cheguei aos trinta da seguinte forma: primeiro, reuni um grupo grande de nomes de pessoas que, tendo nascido na região, ou apenas atuado no Nordeste, ganharam notoriedade. Desse grupo, exclui as personalidades ainda vivas, em relação às quais não temos perspectiva histórica. O passo seguinte foi distribuir as celebridades em seis categorias (Políticos, Empresários, Religiosos, Literatos, Artistas e “Perseguidos”). Finalmente, os nomes foram submetidos ao buscador Google. Os cinco que, em cada categoria, apareceram com maior número de citações foram “eleitos”.

O método tem problemas, claro. Em um caso, as distorções eram tão óbvias que decidi ignorar os resultados: o nome “João Pessoa” é, de longe, o mais citado entre os políticos. Mas as citações se referem muito mais à cidade do que ao homem. Nessas condições, achei melhor desclassificar o candidato. Há uma infinidade de outros problemas, que não pretendo negar, mas esse foi o maior e o único em que os resultados do Google foram ignorados.
Os trinta nordestinos já falecidos mais citados no Google
Ordem
Políticos
Empresários
Religiosos
Literatos
Artistas
Perseguidos
1
Rui Barbosa
Assis Chateaubriand
Padre Cícero
Castro Alves
Luiz Gonzaga
Lampião
2
Joaquim Nabuco
Delmiro Gouveia
Dom Helder Câmara
Gonçalves Dias
Dorival Caymmi
Zumbi dos Palmares
3
Deodoro da Fonseca
José Ermírio de Moraes
Beato José Lourenço
Jorge Amado
Vitalino
Corisco
4
Epitácio Pessoa
J. Macedo
Antonio Conselheiro
Gilberto Freyre
Jackson do Pandeiro
Gregório Bezerra
5
Antonio Carlos Magalhães
Norberto Odebrecht
Frei Damião de Bozzano
Luís da Câmara Cascudo
Patativa do Assaré
Antonio Silvino

O quadro pode ser lido horizontalmente ou coluna por coluna. Na primeira opção, um fato a destacar é que, dos seis primeiros lugares em suas respectivas categorias, nada menos de quatro são originários ou atuaram no Sertão e Agreste: Assis Chateaubriand, Padre Cícero, Luiz Gonzaga e Lampião. Mesmo levando em conta que Chateaubriand e Luiz Gonzaga fizeram suas carreiras, principalmente, no “sul” do país, essa alta incidência é surpreendente, pois contrasta com a pequena importância demográfica ou econômica que o Semiárido nordestino sempre teve. Como explicá-la?

Aceito sugestões.

(Publicado também em www.blogdatametrica.com.br. 
Uma versão anterior está disponível em http://mauricioromao.blog.br/)

segunda-feira, 12 de setembro de 2011

Vitalina bota pó


Vitalina sf Reg (Nordeste) Moça idosa; solteirona.
Ir para o caritó, gír (Nordeste): ficar solteira.
 Dicionário Michaelis
Para construir, na Bahia, uma fábrica de cosméticos quase duas vezes maior que a de São José dos Pinhais (PR), onde fica a sede do grupo, o Boticário vai investir R$ 355 milhões, de acordo com anúncio feito na última quinta-feira (8/9/11) pelo presidente da companhia, Artur Grynbaum, na presença do governador Jacques Wagner. Serão produzidos na nova fábrica itens de perfumaria e cuidados pessoais, como cremes, loções e xampus. A decisão reflete as expectativas otimistas quanto ao desempenho da economia regional – em particular, o crescimento da renda da chamada nova classe média. É, também, uma contribuição à beleza das nordestinas e nordestinos.

Na verdade, a presença da empresa na região já é significativa (800 lojas, além das vendas pela internet e porta a porta), mas a maior proximidade da fábrica facilitará ainda mais a difusão dos produtos. Com o mesmo objetivo, o grupo Boticário inaugurou, no início deste mês, no Shopping Iguatemi, em Fortaleza, sua primeira loja da marca Eudora, “que tem como foco a sensualidade da mulher brasileira e se volta mais especialmente para as classes B, C e D”, de acordo com o presidente Artur Grynbaum. Ele afirma, ainda: “esses novos consumidores estão ávidos pela beleza, que os ajuda a ser incluídos socialmente”. (“O Boticário entra na venda direta para brigar com Natura e Avon”, Raphael Gomide, iG Rio de Janeiro, 17/08/2011.)

Competição nesse setor, sobretudo na modalidade de varejo porta a porta, é o que não falta. E o Nordeste tem se saído bem. Um exemplo disso: em agosto, a Avon premiou a cidade de Araripina, em Pernambuco, como campeã de vendas. No último trimestre de 2010, os 2.500 revendedores da região em torno daquele município obtiveram a maior alta comercial do período, em todo o Brasil. O feito, considerado “fundamental para os resultados da empresa, conferiu aos comerciantes um prêmio nacional, com direito a recompensas” (“Região Nordeste atrai líderes do mercado de porta a porta”, Diário do Comércio e Indústria, 19/08/11.)

Em Araripina, as pessoas adoram se enfeitar. Precisa saber se ali ainda há quem cante o refrão que eu ouvia quando menino, na casa de minha avó:

Bota pó, vitalina
Tira pó
Que moça velha
Não sai mais do caritó


(Publicado simultaneamente em http://www.blogdatametrica.com.br/, 12 set 2011)

segunda-feira, 5 de setembro de 2011

"Adeus, prefeito": artigo original e repercussão

(Artigo publicado no Jornal do Commercio, Recife, em 28 de junho de 2011. Em seguida, parte da repercussão em outros endereços da Internet)

Adeus, prefeito

Tenho meio século de residência no Recife, onde nasci. Mesmo quando vivi em outros lugares, jamais fiquei dois anos sem vir à minha terra, andar em suas calçadas, dirigir em suas ruas, conviver com suas chuvas. Afirmo, com a autoridade que me conferem o tempo e as andanças, que nunca presenciei um caos urbano igual ao que estamos vivendo hoje, aqui. Pela sua responsabilidade nisso, o prefeito do Recife deveria renunciar.
Adeus, João da Costa.
Buracos não proliferam devido às chuvas, ou por praticarem sexo sem camisinha, eles se multiplicam graças à falta de conservação e
manutenção dos revestimentos que cobrem as ruas. Também chove no resto do mundo, sem as consequências nefastas alegadas pelas autoridades locais. Pela transformação desta cidade naquela com o maior número de buracos por metro quadrado do Brasil, o prefeito do Recife deveria renunciar.
Adeus, João da Costa.
Entre abril e setembro, chove muito no Recife. Não é de hoje, sempre foi assim, nem está se tornando pior. Mas isso, até poucos anos, não implicava em desastre. Se, em vez de buracos, tivéssemos ruas transitáveis, houvesse sinalização adequada e galerias pluviais limpas, não precisaríamos sofrer esses vexames diários. Pelas casas desnecessariamente inundadas e pelo nó cego em que se transforma o trânsito ao menor sinal de chuva, o prefeito do Recife deveria renunciar.
Adeus, João da Costa.
Num exemplo clássico de “desencontro geopolítico”, George W. Bush, o fatídico ex-presidente americano, demorou muito para visitar Nova Orleans, depois do furacão Katrina, que arrasou a cidade, em 2005. Mas terminou indo. Aqui ocorreu o contrário, o alcaide viajou para o outro lado do mundo no momento em que mais se necessitava dele. Por ter desaparecido quando a cidade afundava em chuvas, o prefeito do Recife deveria renunciar.
Adeus, João da Costa.
Pedestres ou cadeirantes somos todos nós. Uns e outros, em algum momento do dia, utilizamos as calçadas. Ou, melhor, calçadas elas seriam, se calçadas fossem, como não o são, melhor seria chamá-las descalçadas. (Dizer que a manutenção das calçadas é responsabilidade dos proprietários não ajuda nada, seria o mesmo que resolver o problema dos buracos transformando-os em bens de utilidade pública, intocáveis.) Pelas imprestáveis calçadas deste burgo, que nos expõem a permanentes desconfortos e perigos, o prefeito do Recife deveria renunciar.
Adeus, João da Costa.
Exercer as prerrogativas do cargo é uma coisa, transformar a atividade administrativa num falso conflito político – João não é mais João – é outra. Por ficar criando e cultivando brigas infantis, em vez de administrar a cidade, o prefeito do Recife deveria renunciar.
Adeus, João da Costa.
Talvez toda essa inoperância seja devida a notórios problemas de saúde, felizmente, já superados. Se assim for, o prefeito merece nossa compreensão: prometemos não exigir que, após sua renúncia, ele tenha casa em rua que vire açude ao simples anúncio da chuva, nem que passe dois meses dirigindo diariamente seu próprio carro nesta cidade que sua administração está tornando inabitável, intransitável, insuportável. Para preservar sua saúde e restaurar nossa paciência, o prefeito do Recife deveria renunciar.
Adeus, João da Costa.

Vera Lopes repercute artigo dando adeus a João da Costa

Um artigo publicado no Jornal do Commercio desta terça-feira, 28, motivou o pronunciamento da vereadora Dra. Vera Lopes (PPS) na reunião plenária de hoje. De autoria do economista Gustavo Maia Gomes e intitulado 'Adeus, prefeito', o texto faz uma crítica ao caos no trânsito do Recife e sugere a renúncia do chefe do Executivo, João da Costa.
Postado em 29.06.2011 - 12:16.

Em artigo, economista Gustavo Maia Gomes pede renúncia de João da Costa

Postado por Priscila Krause às 11:22:33 Recife, 28 de junho de 2011. http://www.blogdepriscila.com.br/index.php?s=Gustavo+MAia+Gomes&sbutt=

Nós lhe pedimos, senhor…

Falando no Recife, muito comentado o artigo do professor de economia e ex-diretor do IPEA, Gustavo Maia Gomes. Em tom de prece e desabafo: Adeus, prefeito.

André Regis

Recomendo a leitura do artigo "Adeus, prefeito", do economista Gustavo Maia Gomes, hoje no JC. 28 jun 2011. http://twitter.com/#!/andregis

Em artigo publicado no JC 28.06.11, economista Gustavo Maia Gomes pede renúncia de João da Costa

Economista Gustavo Maia Gomes pede renúncia de João da Costa - prefeito do Recife

Recife, 28 de junho de 2011. http://marcellofoliveira.blogspot.com/

domingo, 4 de setembro de 2011

Quando o escândalo é legal, não há Polícia Federal


Uma notícia
1. “Uma revolta dos ministros do Supremo Tribunal Federal, que culminou em ameaças até de mandado de segurança contra a presidente Dilma Roussef, levou o governo a rever a proposta orçamentária para 2012 e estudar reajuste ao Judiciário. O pacote pode elevar o teto do funcionalismo para R$ 30,6 mil e inclui aumento de até 56%.” (Folha de São Paulo, 2/9/11)
Dois fatos
1. A remuneração do cargo de juiz federal substituto é de R$ 21.766,16. Constitui requisito que o candidato ao cargo seja bacharel em Direito há três anos, no mínimo. (Edital do XIV Concurso Público; Tribunal Regional Federal, 2011, 1ª Região.)
2. A remuneração para o cargo de professor adjunto, nível I, em regime de trabalho de 40 horas com dedicação exclusiva é de R$ 7.333,67. Constitui requisito que o candidato ao cargo tenha a titulação mínima de doutorado. (Edital de Concursos Públicos n. 6, Universidade Federal do Rio Grande do Sul, 2011.)
Três comentários
1. Em salário, um juiz substituto vale três professores plenos. É certo que há queixas contra os docentes, mas a explicação do desnível não pode ser esta, pois também há reclamações contra os magistrados. Afinal, “tramitaram [em 2009], nos três ramos da Justiça, cerca de 86,6 milhões de processos (...) [mas só] foram proferidas 23,2 milhões de sentenças” [CNJ, Justiça em Números, 2009]. Ou seja, 73% dos processos existentes ficaram inconclusos. E o estoque de pendências continua aumentando.
2. Do professor se exige o doutorado, ou seja, no mínimo, mais quatro anos de estudo que o bacharelado, acrescidos da redação, defesa e aprovação de uma tese. Como a importância do que fazem é comparável, ideal seria que doutores-professores (19 anos de estudo) ganhassem proporcionalmente mais que bachareis-juízes (15 anos). Fazendo os cálculos, o salário do professor com doutorado deveria ser de R$ 27.570,27. “Isso não seria possível”, retruca o ministro da Fazenda. É verdade, mas, então, lembremos Stanislaw Ponte Preta: “ou nos locupletemos todos, ou restaure-se a moralidade”.
3. O argumento “o concurso de juiz tem 100 candidatos por vaga; portanto, ele merece ganhar mais” é infantil. Primeiro, porque, com a quantidade de bachareis em Direito desempregados que existe hoje, é fácil juntar muitos milhares deles ao simples aceno de salários razoáveis. Segundo, porque (um exemplo) se a presidente Dilma abrir concurso prometendo pagar R$ 21.766,16 por mês ao ascensorista do Palácio do Planalto, aparecerá um milhão de candidatos. Mas isso não fará do aprovado alguma coisa mais do que um ascensorista.
Quatro conclusões
1. Sem terem como, efetivamente, pressionar o governo, os professores continuarão ganhando não o que valem, mas o que sobra. Quando fazem greve, são ignorados: ninguém irá morrer por causa disso, e poucos dão real valor à educação.
2. No outro extremo, juízes e seus correlatos nem precisam de greves; basta deixarem circular a notícia de que irão impetrar mandado de segurança contra a presidente que as coisas se resolvem rapidinho. Em favor deles, claro.
3. No longo prazo, temos um problema, pois salários baixos afugentam os professores bons; e professores ruins só podem formar juízes ainda piores.
4. Finalmente, o mais grave: quando o escândalo é legal, não há Polícia Federal.

sexta-feira, 2 de setembro de 2011

Tartarugas e política regional

(Texto a ser inserido nas orelhas do livro Conflito e conciliação: Políticas de desenvolvimento regional no mundo contemporâneo, em fase de publicação pelo Banco do Nordeste) 

 Este livro trata da experiência internacional contemporânea em políticas de desenvolvimento regional, conjuntos de ações de fomento à atividade econômica por meio das quais os governos procuram compensar desvantagens relativas e duradouras em qualidade de vida das populações residentes em algumas partes do seu território. Na maior parte das vezes, sem grande êxito.

Os economistas de formação ortodoxa não gostam desse assunto. Os mercados, deixados sozinhos, tratariam bem da questão, desde que houvesse livre movimentação de trabalhadores. Nesta visão, as políticas de desenvolvimento regional – que, obviamente, interferem nos mercados – são como as tartarugas: existem, sim, mas estão (ou deveriam estar) em vias de extinção.

Não é o que ocorre, na realidade. Há uma razão para isso: ainda que as forças de oferta e demanda pudessem, em algum dia do indeterminado futuro, eliminar as disparidades de rendimentos entre pessoas de mesma qualificação vivendo em diferentes regiões, isso se daria, em grande medida, pela mudança de residência. 

E a verdade é que as mulheres e homens têm apego ao lugar onde nasceram, pois é aí que elas e eles, provavelmente, desenvolvem os laços afetivos que perdurarão por toda a vida. Sendo assim, sempre haverá uma demanda para que as oportunidades de ganho sejam criadas nos lugares em que as pessoas têm raízes, um pressuposto básico das políticas de desenvolvimento regional. 

Patativa do Assaré, poeta popular cearense, sabia disso, quando compôs “A Triste Partida”; Luiz Gonzaga, cantor, pernambucano, migrante, que gravou a música, também:

Chegaram em São Paulo
Sem cobre quebrado
E o pobre acanhado
Percura um patrão
Meu Deus, meu Deus

Só vê cara estranha
De estranha gente
Tudo é diferente
Do caro torrão
Ai, ai, ai, ai

Trabaia dois ano,
Três ano e mais ano
E sempre nos prano
De um dia vortar...
  
Assim são as coisas: enquanto houver pessoas que hesitam em deixar para trás seu lugar de nascimento – caro torrão – ou que, se já estão longe, passam a vida fazendo pranos de vortar, as tartarugas e a política regional não morrerão. 

 Mesmo que elas continuem apenas nadando, nadando... e nada.